
Era uma vez uma princesa que se apaixonou pelo príncipe errado e fim da história. Era uma vez um príncipe que amou a princesa que preferia, mil vezes, o sapo. Era uma vez um príncipe que preferia o sapo, por falta de outro príncipe na história. E assim são os contos de fadas modernos, reflexos desses amores verdes de hoje em dia, tão distantes daqueles amores “feinhos” descritos por Adélia Prado.
Amor, por princípio, devia ser algo simples, porque amor a gente dá e pronto. Não exige retorno e independe do consentimento do outro. Eu amo. Ponto. E isso não obriga ninguém a me amar também. Amo o outro integralmente. A gente age assim com pais, sobrinhos, irmãos, amigos, mas por que é tão difícil abandonar a idéia de contrapartida quando estamos com alguém? Por que gostamos tanto de provas de amor? Por que medimos, mesmo que inconscientemente, o amor? O cinema nos faz esperar um príncipe que fez burrada, louco e desesperado, correndo pra nos impedir de embarcar rumo a um destino sem ele? Por que, nem sempre, valorizamos o amor simples que, como no poema de Adélia, “tudo que não fala, faz”?
Eu não tenho as respostas, mas andei pensando sobre isso ao conversar com minha sobrinha Lara que, do alto dos seus 5 anos, me dá algumas lições valiosas sobre a essência da coisa: a simplicidade. “Tia Nine, quando estou com saudade de alguém que não está perto, eu faço assim”, ela me disse enroscando os braços em torno do pescoço. “Daí eu fecho os olhos e passa”, revelou a técnica que usa, principalmente, quando sente falta da vovó. Alguém pode me dizer o que pode ser mais simples do que esse gesto de amor incondicional, que não exige sequer a presença do outro?
Não vou tecer teorias sobre os porquês da bagunça emocional que atinge um monte gente. Suposições demais pra vida real. Mas, vou me permitir um palpite: falta nos casais a simplicidade do amor feinho, de Adélia, da minha vó, da sua, de gente forte que decide amar sem firulas, sem o cinema, sem essa de príncipe e princesa. Porque o amor feinho, se você pensar bem, deve ser o que acontece nos contos de fada depois do “e foram felizes para sempre.”
Eu quero amor feinho.
Amor feinho não olha um pro outro.
Uma vez encontrado, é igual fé,
não teologa mais.
Duro de forte, o amor feinho é magro, doido por sexo
e filhos tem os quantos haja.
Tudo que não fala, faz.
Planta beijo de três cores ao redor da casa
e saudade roxa e branca,
da comum e da dobrada.
Amor feinho é bom porque não fica velho.
Cuida do essencial; o que brilha nos olhos é o que é:
eu sou homem você é mulher.
Amor feinho não tem ilusão,
o que ele tem é esperança:
eu quero amor feinho.
Adélia Prado